SUBDESENVOLVIMENTO: PROBLEMA ECONÔMICO OU PSIQUIÁTRICO?


Muitas vezes o subdesenvolvimento é tratado por aqui como sinônimo de pobreza, de dificuldade de acesso a bens materiais. Em outras é descrito como um estágio pelo qual temos que passar no caminho para nos tornarmos uma sociedade desenvolvida e justa.

Pois eu afirmo que o desenvolvimento é um fenômeno psicológico e que não há qualquer garantia que uma sociedade possa transcender essa fase e ascender a níveis mais elevados de civilização.

Tomemos como exemplo algumas coisas próximas a nós. Numa administração estadual ou municipal, parece lógico que o secretario de saúde não seja um médico? Ou, trazendo a discussão para mais perto dos meus temas habituais, que um secretario de obras e/ ou planejamento urbano seja outra coisa que um arquiteto/urbanista? Porto Alegre teve até há pouco tempo como secretario de Obras e Viação um ex-jogador de futebol, pessoa muito agradável, mas totalmente despreparada para o cargo que ocupava.

Dá pena ver o atual secretario de Planejamento (que aliás já foi secretario de Educação!) comandando um processo de revisão do Plano Diretor de Porto Alegre e defendendo idéias que não são suas e que não domina. Quando vão se dar conta de que para conduzir processos complexos como o urbanismo não é suficiente ser um bom político, e que é preciso técnicos competentes nesses postos chave?

Tudo isso para mencionar o tema das obras públicas. Somos seguidamente surpreendidos por obras que surgem do nada e cuja qualidade quase sempre é muito baixa. Talvez porque não sejam “do ramo”, os secretários não entendem que essas obras —praças, monumentos, parques, etc— deveriam ser realizadas a partir de concursos públicos.

Os concursos públicos, além de propiciarem que se encontre o melhor projeto para a necessidade pública —pela quantidade de profissionais que participam deles— servem para divulgar os atos das administrações, envolver a população mais diretamente com a arquitetura e o urbanismo, permitir que os arquitetos cumpram o propósito para o qual foram treinados —que é servir à coletividade— e ainda por cima fomentar o desenvolvimento da profissão.

Ou seja, podem ao mesmo tempo obter o melhor para a cidade e cumprir um papel cultural fundamental.

Ao invés disso, as secretarias de obras nos impõem projetos realizados pelos seus próprios funcionários —que por terem muitas outras tarefas não podem se preparar suficientemente para isso— ou oriundos de licitações em que a preocupação principal nunca é a qualidade do projeto e, consequentemente, do espaço ou edifício público que resultará dele.

Essas são atitudes de país subdesenvolvido, que privilegiam interesses mesquinhos em vez da qualidade de vida da população, e que só consideram o curto prazo, sem entender que as cidades se desenvolvem no médio e longo prazo.

Enquanto isso, na Europa, há tantos concursos públicos de projeto que há sites e revistas cujo único propósito é divulgar os concursos para os arquitetos e os resultados dos mesmos. O numero é tão grande que muitos arquitetos europeus constroem suas carreiras sem ter nunca realizado uma única obra privada; todos os seus trabalhos são obtidos por meio de concursos.

A imagem acima é da Praça Torrents i Lladó, em Badalona, Espanha, obra pública que foi objeto de concurso vencido pela arquiteta Bet Figueras.

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Um comentário:

luiz zine disse...

Pois é, Mahfuz. Este espaço tem se mostrado infelizmente uma ilha solitária de discussão de temas importantes, que parecemos não julgar importantes ao ignora-los. Mas melhor uma ilha do que nenhuma... quem sabe não surgem outras?
A gestão não-profissional do que é público e portanto nosso passa pelas nossas mãos. Continuamos nos portando como usuários de origem paternalista, esperando que o paizão/mãezona prefeito/a cuidem do que é nosso, sejam coerentes, sejam sensatos, sejam justos e decentes. O que é pior: o que acontece quando não o são? Nada, pois neles votamos novamente.
Mais oportuno ainda é tua constatação sobre esta síndrome de pequeneza cronica, de eterna postura subdesenvolvida. Rogo que te mostres errado, que o tal do futuro um dia chegue.
Tanto tu como outros tantos bons arquitetos e cidadãos, defendes a bandeira do concurso há muitos anos, especialmente para as obras públicas. Mas infelizmente a brodagem e os conchavos que seguem escolhendo as cartas, os interesses proprios ou de grupos seguem prevalecendo e por aí vamos...
A solução? Panelaço, barulho, reclamação. Acomodação não muda nada...
Grande abraço,
Luis Pedro