CHOQUE DE REALIDADE


O Brasil é um país de contrastes. Isso faz com que nossa percepção deste país oscile de um extremo ao outro, da depressão à euforia delirante. em alguns casos, nos parece viver no pior lugar do mundo. Outras vezes, dependendo dos lugares que frequentamos, somos levados a crer que já chegamos ao desenvolvimento, que fazemos parte do chamado Primeiro Mundo.

Essa percepção delirante pode ser induzida pela frequência aos shopping centers, à lojas de importados, à muitas horas na frente da televisão e à leitura de certas revistas dedicadas ao beautiful people.

Essa sensação a qual, não nego, pode ser até agradável pelo tempo que dura, começa a arrefecer quando olhamos o que os europeus fazem em termos de habitação popular e comparamos com o que é feito no Brasil. Enquanto aqueles edifícios, construídos para a faixa mais baixa de renda, são melhores —tanto em termos de projeto quanto de construção— que os edifícios de luxo construídos por aqui, a nossa habitação social é em geral indigente, mal projetada e não ajuda a conferir dignidade e identidade aos seus moradores.

Mas o golpe final, o proverbial golpe de água fria, vem quando nos defrontamos com coisas como as fotos de uma prisão austríaca que me enviou a artista Maria Tomaselli. Uma prisão toda de vidro! E a qualidade dos espaços interiores! A foto da cela mais parece um quarto para estudantes. O choque aumenta quando nos lembramos do que são as nossas próprias prisões, os nossos carandirus e febems.

Mais um exemplo para nos chamar de volta à realidade. Embora o Brasil de hoje seja melhor, pelo menos em alguns aspectos, do que o de ontem, ainda há MUITO a fazer para que possamos ter uma qualidade de vida parecida à dos europeus e norte-americanos.

Enquanto isso, caso eu seja preso por alguma razão, já peço de antemão para cumprir minha pena na Áustria.


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3 comentários:

Anônimo disse...

acho que entendo o que quer dizer. (e em parte acho justo)
mas como só acho, quero opinar sobre certas possibilidades em relação ao que se possa entender do que aponta.

entre nós, parece mais comum um 'complexo de vira-latas'; que nos faz sentirmo-nos diminuídos diante desta qualidade que aponta (ao menos uma delas, se não a única delas).

sem dúvida, temos muito que fazer em termos de nos organizarmos (sobre tudo). tornarmos nossos meios mais capazes de satisfazer nossas necessidades.
mas, acho que devemos ter cuidados na definição de nossas necessidades.

bom, isto, tomado essencialmente, muda tudo. ao ponto, inclusive, de direcionar e definir estes meios e a que 'organização' almejamos.

dizendo de outra forma.
não compartilho de certa visão comum - e 'hegemônica' (em todos os sentidos; e na maioria das vezes mais interessante aos outros, do que a nós mesmos) - de que, por exemplo, certo emprego de materiais - na arquitetura -, cujo desenvolvimento implica altíssimo e oneroso uso de técnicas e recursos, resulte no melhor.
nem acredito na maior capacidade de uma elaboração mais culta (definir o que seria isto é também questão que demanda certa própria elaboração; e que não tem parâmetros ‘indiscutíveis’; como ‘civilização’) e ‘complexa’ e sofisticada, em termos projetuais (em se tratando de arquitetura e no que quer que seja), no sentido mais comum em que se tomam tais termos.

desfrutamos de condições climáticas (e técnicas e econômicas e culturais – complexo de vira-latas inclusive) muito diferentes e, diria, mais favoráveis, a ponto de ser-nos suficiente, muitas vezes, uma mera cobertura de folhas de uma palmeira qualquer, encontrada de grátis (por enquanto).
e isto não torna nossas vidas pior. muito ao contrário.
suspeito que a busca (injustificada, em todos os sentidos) de “nos superar”, buscando no que nos é estranho e estrangeiro a solução, é que nos tem feito bem piores. inclusive no conseqüente sentimento de “sermos vira-latas”.

a cabana talvez nos seja melhor (diria então que mais do que o vidro, nos tem faltado atenção às palmáceas, por assim dizer).
com elas, nos sobra tempo para fazermos coisa mais interessante do que... arquitetura, por exemplo (enquanto outros, como a formiga, devem proceder a trabalho árduo para enfrentar seus invernos, como cigarras, podemos passar nossos verões cantando e dançando).
contudo, aos que apetece (eu me incluo), cabe praticar certa arquitetura (uma cabana com graça!?), mas não nos moldes em que ela nos tem sido imposta, com a nossa tácita concordância.

tirante a metáfora e as situações em que a cabana seja mesmo pouco, de prisões de vidro (voltando à metáfora) não precisamos.
aprender com todos sim, mas fazer o que nos cabe. porque, se não, não se tem propriamente aprendizado.
é o que me parece.

sérgio

luciano l. basso disse...

Edson, em Santiago estão finalizando um presídio nos moldes desdes, quiça até mais interessante arquitetônicamente... mas este tipo de albergue (como os chilenos o chamam) é apenas para o regime semi-aberto, ou seja, pensa bem no crime que tu vai cometer... :)

abraço
luciano

Anônimo disse...

Assisti uns dias atrás, uma entrevista com um advogado q fez um curso sobre sistemas penitenciários na Espanha, em certo momento o palestrante citou as penitenciárias brasileiras como sendo um sistema medieval. Impressionante o atraso que temos em determinados aspectos.
abraço
Michelen